março 26, 2010

COERÊNCIA E INCOERÊNCIA> O sentido da vida: entre a coerência e a incoerência








“O sentido de coerência lógica ou teleológica tem poder sobre os homens em todas as partes, mais do que qualquer outra força da cena histórica” (Max Weber, in:Considerações Intermediárias, p. 318).




Porque somos atraídos pela religião? Porque cremos, sem provas? O Deus católico, sem face, que exige a fé sem questionamentos! Ou, no outro extremo, no campo científico: porque nos importa tanto que uma pesquisa ateste algo como verdadeiro? Que legitime nossas escolhas? É comum dizer “mas, tem uma pesquisa que comprava o que estou dizendo...” Porque necessitamos de um sentido de vida para viver? Porque essa necessidade por uma coerência entre as nossas ações e sua finalidade ética?
Pois, mesmo os ricos, aparentemente tidos como os “felizes” precisam justificar sua felicidade, dar a ela um sentido. O movimento protestante, como bem comprovou Weber, nasce exatamente como uma tentativa da nova classe burguesa de ficar em paz com seu enriquecimento, de justificá-lo. Assim como os pobres, que precisam de uma explicação para suportar seu sofrimento, mesmo que seja a promessa de um paraíso após a morte. Assim, ou no "aqui agora", para os ricos: ou no "para além da vida" para os pobres, a existência precisa justificar-se, ter sentido, coerência.
É nesse sentido que tanto a religião, como a ciência são, ambas, formas de racionalizar o mundo, de dar a ele uma coerência, uma resposta. Temos de nos agarrar a algo, temos de acreditar que não é em vão a nossa existência.
Mas, há ainda outra posição, que não é nem a do cientista, nem a do crente. Qual seja? A do homem, mulher que assumiu a incoerência do mundo. Daquele que a princípio está consciente que na vida não há mais do que sentidos provisórios, históricos e repletos de valores e morais. Aquele que assumiu que não há verdade, não há sentido. Nem crente, nem cientista, mas um niilista. Um descrente. O cético.
E há nesse assumir a incoerência inerente a vida duas possíveis posturas. Uma é negar a vida, é tornar-se indiferente a tudo, é desistir dela. É o homem que percebeu que o campo ideológico domina toda a esfera da vida social e a conduz. O homem que se deu conta que tudo não passa de uma construção de um sentido para o mundo> tanto no campo religioso, como científico. Não há verdade, não há sentido último. E, por essa razão ele desiste de lutar uma luta vã. De ser mais um soldado de uma guerra que não é sua, travestida em um falso sentido comum, "patriótico". Desiste de participar do jogo e comete, assim, uma espécie de suicídio simbólico (o que Nietzsche denominou de niilista fatigado).
Mas, há ainda uma segunda postura, a mais interessante ao meu ver. Daquele que ao assumir a incoerência do mundo não tomou uma atitude desinteressada frente a ele. Ao contrário, percebeu as belezas da incoerência, as nuances e a complexidade de suas cores, ao contrário dos tons uniformes, homogêneos da coerência. Trata-se de um olhar apurado, que não precisa de bengalas religiosas e científicas para dar sentido a vida. A vida tem sentido em si mesma, em toda a sua incoerência, em tudo o que pode nos surpeender e oferecer. Niilista ativo: o legítimo afirmador da vida no que há de bom e de mal. Um afirmador da incoerência.